
DEZEMBROS
Com a manhã a corrente limpa o fundo num rojo manso, varre os limos ao limbo alagado da margem larga de Dezembro. No lugar dos aluviões a estação descobre um areal magro, despontadas praias do Grande Rio Barrento, cama líquida onde o canto do boto estende as mulheres da tribo quando a lua enche. E tu não sabes - não sabes, nem podes saber - que (em verdade) sou eu quem renasce com a manhã da véspera de Natal!... Não sabes que sou eu que te regresso, que sou eu quem se desembrulha do papel de arroz salpicado a púrpura cor de vinho, que sou eu quem chega de dentro da caixa de cartão, num canudo de papel em forma de aviãozinho desenhado em dobras minuciosas... Não sabes que me sacas a alma de longe, entre retratos de índio, sons de fita tropicana e escorreitas contas de marubo. Não sabes, nem podes saber. Mas sou eu sim - como um colar de limos - quem volta a boiar à superfície... desencravada do distante silêncio do fundo... arrancada à margem dormente... devolvida ao correr da correnteza que outra vez me deriva em ti. Como um risco na espuma branca do teu rosto invisível. Como uma encomenda postal. Como um milagre de carteiro. Como um duplo toque de campaínha ao meio da manhã. Em véspera de Natal.
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